Os séculos XVII a XX foram sem sombra de duvidas os períodos de várias revoluções ideológicas, sociais, espirituais, econômicas e políticas. O surgimento do estado providência após a falha do estado liberal proporcionou um conjunto de desafios complexos dos estados para o cumprimento das obrigações sociais. Vários estados adoptaram estratégias de intervenção sobre a economia para cumprir com as suas funções sociais, tais como: a educação, assistência médica, e etc. Quanto mais os estados tornavam-se intervencionistas mais responsabilidades agregavam, ou seja, a intervenção é diretamente proporcional a responsabilidade, aumenta as atribuições e competências dos governos e consequentemente das instituições da administração pública de forma a dar respostas as necessidades dos cidadãos. No entanto o excessivo intervencionismo tornou os governos excessivamente burocráticos, ineficazes e ineficientes, não cumpridores das suas funções sociais, obrigando os estados a reformas com objectivo tornarem-se apenas reguladores do sistema econômico, com o fim de diminuir as suas excessivas responsabilidades.
Actualmente os estados por meio das suas constituições posicionam-se como reguladores do sistema econômico, até aí tudo bem. Mas na pratica têm voltado a adoptar políticas públicas de intervenção do mercado, ou seja, para cobrir as carências sociais alguns estados principalmente sob governo de partidos políticos de esquerda têm levado a cabo políticas públicas de intervenção na economia.
Quando podemos considerar que o estado está ser intervencionista? É possível o estado cumprir com a sua função social sem ser intervencionista? Qual é o momento adequado para os governos intervirem na economia?
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Para responder a primeira questão iremos recorrer a famosa frase “O melhor governo é aquele que menos governa”, segundo Mises (2009,p.47) “ intervencionismo significa não-restrição, por parte do governo, de sua actividade, em relação à preservação da ordem, ou- como se costumava dizer cem anos atrás – em relação à produção da segurança”, em outras palavras a visão do autor é que o estado deve preocupar-se em garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, por meio de restrição da sua acção na manutenção da ordem e segurança, garantir a educação, assistência medica e medicamentosa, aposentadoria entre outras responsabilidades sociais. A realidade tem sido contrária por parte de vários governos de esquerda, levando-nos a crer que não é possível manter-se como reguladores e cumprir com as suas funções sociais. A vontade de acelerar a economia e reduzir as desigualdades sociais propicia políticas públicas para o cumprimento deste desiderato, mas esquecemo-nos que a economia se auto regula. Toda tentativa de intervenção na economia trás consigo consequências que na maior parte das vezes são negativas, é como se quisemos explorar a natureza para suprir as necessidades do presente sem contar com as suas consequências do futuro. Tal como na natureza, a economia para o seu crescimento deve obedecer ao principio da sustentabilidade e o seu crescimento apenas pode ser proporcionado pelos os seus principais actores, a classe empresarial e os Consumidores.
A Constituição da República de Angola no seu capítulo I, dos Princípios Gerais da Organização Económica, Financeira e Fiscal, no artigo 89º, define que a organização e a regulação das actividades económicas assentam na garantia geral dos direitos e liberdades económicas em geral, na valorização do trabalho, na dignidade humana e na justiça social, em conformidade com os seguintes princípios fundamentais:
a) Papel do Estado de regulador da economia e coordenador do desenvolvimento económico nacional harmonioso, nos termos da Constituição e da lei...
A nossa legislação tal como a maioria dos países democráticos de direito, posiciona o estado como regulador, mas, no entanto, o nosso governo tal como nos governos de esquerda toma iniciativas intervencionistas reguladas por lei obedecendo os princípios da Constituição. Algumas políticas públicas como o PRODESI (Programa de Apoio à Produção, Diversificação das Exportações e Substituição das Importações) e o PAPE (Plano de ação e promoção da empregabilidade) têm como objectivos acelerar o crescimento económico e reduzir as desigualdades sociais, contrariamente ao estabelecido, os resultados costumam a ser informalização da economia e aumento de preços. Não é necessário ser um expert para compreender a logica econômica, o pensar e agir do ser humano, se analisarmos objectivamente o PRODESI pretende substituir as importações pelas exportações nos diversos sectores desde agricultura a construção civil, significaria necessariamente uma redução na capacidade de oferta de serviços a nível qualitativo e quantitativo, maior envolvência dos gestores públicos nas decisões económicas e mais acesso montantes financeiros, este processo culminará no aumento da demanda a serviços e de menor qualidade resultando no aumento de preços e a probabilidade de aumento da corrupção por parte de quem toma a decisão. Pese embora a profundidade e conformidade teórica e financeira dos programas mencionados, a expertise dispensada para a sua elaboração nos remeteria a uma discussão profunda e complexa que dificilmente terminaríamos, a sua aplicação vai dando indícios da razão logica econômica e humana, ou seja, ser humano imperfeito e economia auto regula-se. Quando assistimos os canais televisivos públicos a entrega de kit´s profissionais do PAPE para alfaiate, construção civil, canalização e outros, a jovens que nem se quer sabem definir a palavra empreendedorismo ( sem desconsideração a juventude), imaginemos a sua compreensão de politica fiscal, que inclusive os próprios técnicos Administração Geral Tributária têm dificuldades em compreender, logo percebemos que o resultado será o crescimento da economia informal. Ao refletirmos que o montante financeiro alocado para este investimento público, por exemplo: destinado a 5000 (Cinco Mil) jovens e cada um destes jovens receberam um kit´s correspondente a 1.000.000,00 AOA ( Um milhão de Kwanzas ), este valor corresponderia a 5.000.000.000,00 AOA ( Cinco Bilhões de Kwanzas ), que poderia ser concedido em créditos pela Banca 500 (Quinhentas) Pequenas Empresas sem necessária intervenção do Estado, bastando apenas o próprio estado não concorrer a financiamentos que poderiam ser destinados a privados. A não iniciativa do governo, ou seja, a não criação destas políticas públicas proporcionaria um desenvolvimento de maior sustentabilidade.
O que faria o governo?
O governo aumentaria o valor destinado ao PIIM (Programa Integrado de Intervenção dos Municípios), de forma a aumentar o saneamento básico, proporcionar mais acesso a educação, saúde e outras funções sociais que podem ser cumpridas sem ser intervencionista e que proporcionariam resultados eficientes e eficazes se estivessem associados aos princípios de boa governança. Mas é importante realçar que a intervenção do estado nem sempre é má, pode ser feita, uma vez que o mercado tem as suas falhas e a governabilidade pode estar sujeita a contextos de incertezas, como por exemplo: a pandemia da covid 19 representou o calcanhar de Aquiles para as economias, neste contexto apela-se a intervenção do estado para reanimar a economia.
Porquê que muitos governos continuam intervencionistas?
Para respondermos a esta questão poderíamos pensar na celebre frase de Nicolas Maquiavel “A política é a arte de se manter no poder”. A quem defenda que objectivo primordial dos políticos é a manutenção do poder, se for verdade, as políticas intervencionais podem estar na base deste desiderato. Basta recordarmos a mais recente crise econômica de Portugal sob o governo de José Sócrates, que foi substituído pelo governo de Pedro Passos Coelho que aplicou o programa económico do Fundo Monetário Internacional com medidas económicas sustentáveis que retiraram Portugal da profunda crise em que se encontrava e que ainda assim foi substituído pelo governo de António Costa, para compreendermos a importância da legitimidade política para governar, não é suficiente governar bem, é necessário parecer que se está a governar bem para renovar a legitimidade política.
Outra corrente de pensamento defende que os governos devem a todo custo cobrir as carências sociais de forma emergente, não medindo esforços para suprir as carências primarias dos cidadãos, mesmo que estás que estás não sejam sustentáveis e propiciarem dependência dos cidadãos ao estado, tal como defende o Ex-Presidente do Brasil Luís Inácio Lula Da Silva, que congratula-se por ter tirado mais brasileiros da pobreza, que tão logo o PT ( Partido Trabalhista) saiu do poder, voltaram novamente a situação de pobreza porque o crescimento econômico no período do Partido Trabalhista foi canalizado para investimentos públicos sobrefacturados e subsídio de pobreza as famílias vulneráveis e não vulneráveis.
Independentemente de defender-se um ou outro pensamento, a realidade é que vai aumentando contexto de incertezas do século XXI desde a crise financeira mundial em 2008 a pandemia da covid 19 em 2020 e exige cada vez mais governos responsáveis e estratégias de desenvolvimento na base da sustentabilidade, direcionando a actuação para as principais responsabilidades. A boa governança remete aos governos ao papel de coordenadores de conjunto de redes de interesses colectivas e individuais com objectivo de dar respostas eficazes e eficientes por meio de políticas públicas guiadas pela administração pública desburocratizada e por serviços públicos que correspondam as demandas qualitativas e quantitativas da sociedade, através da capacitação e qualificação de quadros, da integração e cooperação das instituições, modernização dos processos e procedimentos (administração 2.0), lideranças transformacionais e integradoras e remunerações compatíveis as necessidades. A redução das funções do estado para legalidade, eficiência e eficácia dos governos é incontornável e representa um desafio de grande magnitude para aqueles que pretendam atingi-las.
Hermenegildo Coelho
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